domingo, 23 de maio de 2010

PIN E PIN +: recuo da protecção ambiental ou reforço de garantias de celeridade

1. Considerações Iniciais

Pretendo com este trabalho realizar uma exposição acerca do enquadramento legal do regime jurídico dos Projectos de Potencial Interesse Nacional (PIN) e dos Projectos de Potencial Interesse Nacional com importância energética (PIN +), complementada por uma pesquisa relativa ao conjunto de questões suscitadas pelos Deputados à Assembleia da República acerca destes diplomas legais, bem como, a análise do conflito entre a celeridade a dar aos processos relativos a estes projectos e a protecção ambiental e ainda um olhar sobre as falhas legislativas e práticas seguidas nestes procedimentos.

2. Enquadramento Legal do Regime Jurídico dos Projectos de Potencial Interesse Nacional (PIN) e dos Projectos de Potencial Interesse Nacional com importância energética (PIN +)

A pretexto da dinamização do investimento empresarial que promova actividades que diversifiquem a base económica actual, a criação de emprego qualificado e criação de valor acrescentado para o país, veio o Governo, através da Resolução do Conselho de Ministros n.º 95/2005, de 24 de Maio, entretanto revogada pelo Decreto-Lei n.º 174/2008, de 26 de Agosto, criar um sistema de reconhecimento e acompanhamento de Projectos de Potencial Interesse Nacional (PIN), que estabelece as regras e procedimentos para o reconhecimento e o acompanhamento dos projectos PIN, que reúnam os requisitos cumulativos seguintes, constantes do Artigo 1.º:

a) Representem um investimento global superior a 25 milhões de euros;

b) Possuam comprovada viabilidade económica e reconhecida idoneidade e credibilidade do respectivo promotor;

c) Visem a instalação de uma base produtiva, com forte incorporação nacional, criadora de valor acrescentado bruto;

d) Integrem nas prioridades de desenvolvimento definidas em planos e documentos de orientação estratégica em vigor, designadamente nos seguintes: Estratégia Nacional de Desenvolvimento Sustentável, Plano Tecnológico, Programa Nacional de Política de Ordenamento do Território, Plano Estratégico Nacional do Turismo, Estratégia Nacional para a Energia, Portugal Logístico;

e) Sejam susceptíveis de adequada sustentabilidade ambiental e territorial;

f) Apresentem um impacte positivo em pelo menos cinco dos seguintes domínios:

i) Produção de bens e serviços transaccionáveis, de carácter inovador que lhes confira clara vantagem face à oferta existente e em mercados com potencial de crescimento;

ii) Efeitos de arrastamento em actividades a montante ou a jusante, particularmente nas pequenas e médias empresas;

iii) Introdução de processos tecnológicos inovadores ou colaboração com entidades do sistema científico e tecnológico;

iv) Criação mínima de 100 postos de trabalho directos em fase de laboração e qualificação do emprego gerado através de formação desenvolvida por entidades formadoras certificadas;

v) Inserção em estratégias de desenvolvimento regional ou contribuição para a dinamização económica de regiões do interior ou com menor grau de desenvolvimento;

vi) Balanço económico externo, nomeadamente no aumento de exportações ou na redução de importações;

vii) Eficiência energética ou favorecimento de fontes de energia renováveis.

O n.º 3 do Artigo 1.º do regulamento abre, ainda a porta a que possam ser reconhecidos como PIN projectos de valor igual ou inferior a 25 milhões de euros desde que tenham uma forte componente de investigação e desenvolvimento (I&D), de inovação aplicada ou de manifesto interesse ambiental e desde que satisfaçam as condições fixadas referidas acima.

Já no que toca aos projectos turísticos, além dos requisitos referidos no n.º 2 deve, ainda, verificar-se o seguinte requisito: classificação mínima de 5 estrelas para estabelecimentos hoteleiros ou, no caso de conjuntos turísticos, a integração, pelo menos, de um estabelecimento hoteleiro de 5 estrelas, não podendo os restantes empreendimentos turísticos possuir classificação inferior a 4 estrelas.

A aplicação dos critérios referidos no n.º 2 é efectuada de acordo com os seguintes parâmetros:

Quanto à produção de bens e serviços transaccionáveis de carácter inovador e em mercados com potencial de crescimento é considerada a inovação de serviços, processos e produtos, ponderando o grau de novidade em termos de empresa, região ou sector; a produção de bens e serviços que podem ser objecto de troca internacional ou expostos à concorrência externa; e a inserção em sectores com procura dinâmica no mercado global.

Já no tocante aos efeitos de arrastamento em actividades a montante ou a jusante, principalmente nas pequenas e médias empresas, será ponderada a valorização da cadeia de fornecimentos de modo a incorporar efeitos estruturantes, designadamente em actividades de concepção, design e certificação de sistemas de qualidade, ambiente, higiene e segurança e saúde no trabalho e responsabilidade social; a existência de estímulo à abertura a novos canais de distribuição, bem como o processo de internacionalização de fornecedores e clientes; e a valorização de recursos endógenos, designadamente os renováveis, e de resíduos com valorização das situações associadas à redução dos impactes ambientais.

Também será devidamente ponderada a introdução de processos tecnológicos inovadores ou colaboração com entidades do sistema científico e tecnológico, de acordo com os seguintes critérios:

Envolvimento em acordos de cooperação de carácter relevante com instituições do ensino superior, centros tecnológicos e outras entidades no âmbito do desenvolvimento científico e tecnológico em novos processos, produtos e serviços ou a sua melhoria significativa; e a criação de estruturas comuns de investigação e desenvolvimento.

No que toca à criação e ou qualificação de emprego em fase de exploração, analisar-se-á os efeitos da criação e qualificação de emprego directo local ou regional e os efeitos indirectos na criação e qualificação de emprego, mas também, o desenvolvimento de iniciativas em parceria visando a criação de estruturas de formação e qualificação, ponderando-se, ainda, a abertura para a qualificação do emprego, nomeadamente através da promoção de estágios profissionais ou acções de formação.

A propósito da inserção em estratégias de desenvolvimento regional ou contribuição para a dinamização económica de regiões com menor grau de desenvolvimento será considerada a localização em regiões objecto de tratamento prioritário no âmbito de sistemas de incentivo ao investimento e o seu impacte na estrutura produtiva local/regional em termos de consolidação ou diversificação da base produtiva, olhando para a sua relevância.

Acerca do balanço económico externo que os projectos possam garantir será ponderado o impacte positivo nas relações de troca da economia da região e no grau de exposição aos mercados externos.

Requer-se, no que diz respeito à eficiência energética e ou favorecimento de fontes de energia renováveis, a introdução de processos e métodos de gestão/controlo visando a optimização na utilização de recursos energéticos com impacte significativo ao nível do reaproveitamento da energia, pela introdução de sistemas de co -geração e de técnicas que visem especificamente a redução do consumo de energia e a diversificação de fontes energéticas dando privilégio às renováveis e às de menor impacte ambiental.

No capítulo da sustentabilidade ambiental, ponderar-se-á a compatibilidade com os valores naturais presentes, designadamente com as áreas protegidas e com a Rede Natura 2000 e plano sectorial respectivo, ou susceptibilidade de minimização/compensação de modo a atingir tal compatibilização e, ainda, a compatibilidade com os valores que fundamentaram a classificação de Reserva Ecológica Nacional, Reserva Agrícola Nacional e domínio público hídrico ou susceptibilidade de minimização/compensação de modo a atingir tal compatibilização, mas também, a utilização de tecnologias e práticas ecoeficientes que permitam atingir elevados níveis de desempenho ambiental, nomeadamente nos domínios da água, energia, solos, resíduos e ar, e ainda, a minimização das emissões de gases com efeito de estufa.

Define o n.º 6 do Artigo 1.º que o processo de reconhecimento e acompanhamento de um projecto como PIN é «independente e não prejudica a tramitação processual junto das entidades competentes», mesmo nos casos em que esta «já esteja em curso à data do requerimento».

Já o n.º 7 do mencionado artigo do Regulamento não admite que «requerimentos de reconhecimento de um projecto como PIN, quando os respectivos projectos se encontrem dependentes de resultados de concursos públicos ou de resolução de litígios em que o Estado seja parte» e o n.º 8, ainda desse artigo, exclui de objecto de reconhecimento como PIN os projectos que se integrem nas seguintes classificações de actividades económicas: CAE G (Comércio), J (Financeiro), K (Imobiliário), M (Educação) ou N (Saúde e acção social).

A verificação do cumprimento desses critérios e de outros para permitir o reconhecimento e a avaliação, mas também, fundamentalmente, o acompanhamento dos projectos que sejam classificáveis como PIN caberá a uma comissão de acompanhamento, constituída por representantes da Agência Portuguesa para o Investimento e Comércio Externo de Portugal, E. P. E., que assume as funções de coordenação da comissão, e do Instituto de Apoio às Pequenas e Médias Empresas e à Inovação, I. P., do Turismo de Portugal, I. P., da Direcção -Geral do Ordenamento do Território e Desenvolvimento Urbano, da Agência Portuguesa do Ambiente e do Instituto da Conservação da Natureza e de Biodiversidade, I. P., nos termos do n.º 2 do Artigo 2.º do regulamento, definindo-se, no n.º 3 desse artigo até que limites poderá ocorrer a representação desses organismos. No Artigo 4.º do regulamento são definidas as competências da comissão de acompanhamento que variam entre a monitorização e articulação dos processos à mediação de bloqueios tendo como finalidade a sua eliminação, garantindo a celeridade nos procedimentos, passando, ainda, por funções de informação dos interessados sobre o andamento do processo ou, ainda, a elaboração de informações à tutela do Ambiente e do Ordenamento do Território e à do Desenvolvimento Regional e da Economia e Inovação, com vista a reportar a actividade desenvolvida e os bloqueios insuperáveis ou incumprimentos que da aplicação do sistema se verifiquem.

Quanto ao reconhecimento de um projecto enquanto PIN cumpre, agora, fazer uma exposição do procedimento que lhe está associado e que consta do Artigo 4.º do regulamento:

Os interessados no reconhecimento de um projecto como PIN apresentam o respectivo requerimento junto da Comissão de Avaliação e Acompanhamento – a CAA-PIN – instruído em modelo de requerimento que foi aprovado em sede do Despacho n.º 30950/2008, de 28 de Novembro, sendo pela apreciação e decisão dos projectos PIN devida pelos interessados o pagamento de uma taxa, fixada nos termos definidos em portaria conjunta dos Ministros do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e da Economia e da Inovação, tendo como objectivo o financiamento dos encargos administrativos decorrentes dos procedimentos a desenvolver pela Comissão, repartindo-se a mesma pelas entidades beneficiárias envolvidas.

Uma vez analisados e verificados os elementos instrutórios, a CAA-PIN pode solicitar ao requerente, por uma única vez e no prazo máximo de oito dias úteis, os elementos adicionais que sejam necessários à sua decisão, retomando-se a contagem do prazo para a decisão requerida logo que o processo esteja completamente instruído. Assim que decorridos 30 dias sobre a solicitação dos elementos referidos sem que o promotor proceda à respectiva junção, o processo será arquivado. A decisão sobre o reconhecimento do projecto como PIN é emitida pela CAA-PIN, no prazo «mais curto possível», sem nunca exceder o prazo máximo de 30 dias úteis contados da entrega do requerimento para o efeito e é notificada ao interessado e a todas as entidades participantes no processo, no mesmo dia.

O Artigo 5.º do regulamento define quais os efeitos do reconhecimento de um projecto enquanto PIN e que são os seguintes:

O reconhecimento de um projecto como PIN acciona de imediato o Sistema de Acompanhamento, que obrigará todas as entidades responsáveis ou participantes na tramitação procedimental do projecto à colaboração institucional necessária. Mas refere, ainda o mesmo artigo que o reconhecimento não dispensa o integral cumprimento das normas legais e regulamentares aplicáveis, clarificando-se ainda que que o reconhecimento não é constitutivo de direitos.

Define-se ainda que qualquer alteração ao projecto, incluindo a modificação ou substituição do próprio promotor, que altere os pressupostos em que se encontra fundamentada a decisão de atribuição do estatuto PIN, determina a suspensão imediata do estatuto PIN, abrindo nova fase de reapreciação do projecto por parte da CAA-PIN.

O regulamento prevê ainda a caducidade do reconhecimento de projecto enquanto PIN: «todo e qualquer reconhecimento de projecto como PIN caduca automaticamente se, decorridos 90 dias sobre a comunicação da sua classificação como PIN, o promotor não der início, de forma comprovada, à tramitação subsequente prevista no projecto», nos termos do n.º 4 do citado artigo do regulamento.

Assegura-se ainda que a violação de qualquer disposição legal ou regulamentar por parte do promotor relativamente a qualquer projecto classificado como PIN e seja qual for a fase em que este se encontre, tem como consequência imediata a perda do respectivo estatuto PIN.

O acompanhamento do projecto conduz a que na própria data de emissão da decisão de reconhecimento do projecto como PIN, a CAA-PIN remete às várias entidades participantes toda a documentação apresentada pelo interessado, convocando-as para uma reunião a ter lugar no prazo máximo de 10 dias úteis, sendo que as entidades participantes fazem-se representar nas mesmas condições previstas para a sua representação na CAA-PIN e a agenda da reunião inclui obrigatoriamente um ponto para análise da situação do processo e seus eventuais antecedente, a identificação de possíveis condicionantes e obstáculos ao projecto e respectivas implicações procedimentais, o cronograma dos procedimentos a desenvolver, detalhando o circuito do processo, as obrigações processuais do proponente e uma calendarização de compromisso da Administração em matéria de formalidades e actos, reduzindo, sempre que possível, os prazos máximos fixados na lei.

No que toca ao cronograma para cada projecto PIN, referido acima, este é alvo de validação, em matéria de tarefas e prazos, por todas as entidades da administração central, directa e indirecta, competentes para a prática de actos ou formalidades nos procedimentos aplicáveis ao projecto PIN e o compromisso referente à antecipação, dentro do prazo máximo legalmente estabelecido, da prática de acto ou formalidade por parte da Administração, expresso no cronograma de trabalhos, exclui os actos da competência de membros do Governo. Na reunião é identificada, por proposta da CAA-PIN, a entidade dinamizadora do acompanhamento do processo, a qual designa, de imediato, o responsável pela gestão do processo, em representação do respectivo dirigente máximo. A entidade dinamizadora é uma das integrantes da CAA-PIN, podendo, em situações excepcionais ou fases específicas, decorrentes de procedimentos colaterais ao procedimento de autorização ou licenciamento em causa, ser esta função cometida a entidade considerada mais indicada para o efeito. As conclusões da reunião são registadas em relatório da CAA-PIN, a remeter a todas as entidades participantes e a comunicar posteriormente ao interessado.

Uma vez iniciado o procedimento de acompanhamento a CAA-PIN monitoriza, em articulação com a entidade dinamizadora, a tramitação do processo, podendo, a todo o tempo, chamar novas entidades, bem como convocar reuniões gerais ou restritas de entidades participantes.

O Sistema de Acompanhamento abrange não apenas os procedimentos de autorização e licenciamento do projecto mas também eventuais procedimentos no âmbito dos regimes de uso do solo conexos com o mesmo e os procedimentos de concessão de incentivos financeiros e fiscais. O procedimento de acompanhamento por parte da CAA-PIN termina com o início da execução do projecto.

O Artigo 7.º do regulamento define que a entidade dinamizadora é responsável por acompanhar, numa lógica de proximidade, o desenvolvimento do processo, cumprindo-lhe zelar pelo cumprimento do cronograma acima mencionado e eventuais incumprimentos à CAA-PIN, promover reuniões com as entidades participantes e com o interessado quando tal se revele necessário, tendo em vista o esclarecimento e a concertação de posições, identificar os obstáculos e dificuldades ao prosseguimento do processo e comunica-los à CAA-PIN, indicando, sempre que possível, as alternativas para a sua superação e registar informação actualizada e sistematizada sobre os procedimentos em curso e disponibilizá-la periodicamente à CAA-PIN.

Já o Artigo 8.º define o que entende como dever de cooperação institucional entre os organismos, estipulando que as várias entidades intervenientes no processo de acompanhamento ficam obrigadas a prestar toda a informação e colaboração à CAA -PIN e à entidade dinamizadora no prazo de 10 dias úteis a contar da respectiva solicitação.

No que diz respeito aos projectos PIN+, a tramitação tendo em vista o seu reconhecimento realiza-se quando a CAA-PIN entende que o projecto PIN é susceptível, considerando o seu potencial, de passar a PIN +, procedendo ao seu envio, a fim de obter aval dos ministros das áreas do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolvimento Regional e da Economia. O Decreto-Lei n.º 285/2007, de 17 de Agosto, estabelece o regime jurídico dos projectos de potencial interesse nacional classificados como PIN +, tendo como objectivo a constituição de um mecanismo mais célere de classificação de projectos de potencial interesse nacional com importância energética (PIN +), sendo susceptíveis dessa classificação dos projectos que além de propostos para esse efeito pela CAA-PIN, e que cumulativamente reúnam as condições previstas no n.º 3 do Artigo 2.º do regulamento do sistema de reconhecimento e acompanhamento de projectos PIN, tendo que o atribuição do estatuto de PIN + que ser encarada em complementaridade com o regime dos PIN, articulando-se a aplicação dos regimes do seguinte modo:

O interessado apresenta a candidatura do seu projecto a PIN e se o seu projecto vier a ser classificado como PIN, seguirá a sua tramitação ao abrigo do disposto no regulamento relativo ao sistema de avaliação e reconhecimento de projectos PIN, no entanto, se de entre os projectos candidatos a PIN, aqueles que estejam em condições de preencher os critérios que constam do Decreto-Lei n.º 285/2007, de 17 de Agosto, podem ser propostos pela CAA-PIN à classificação enquanto PIN+, sendo que verificando-se a sua aceitação o projecto seguirá a tramitação legal prevista pelo Decreto-Lei n.º 285/2007, ou então, não sendo possível a sua aceitação, o projecto poderá ser, ainda, classificado pela CAA-PIN enquanto projecto PIN.

3. Questões suscitadas pelos deputados à Assembleia da República acerca destes regimes jurídicos

Alguns dos grupos parlamentares da oposição têm colocado, ao longo do tempo, algumas reticências face ao regime jurídico dos PIN e PIN+, chegando, inclusivé, a apresentar iniciativas legislativas tendo em vista a revogação de ambos regimes, com os fundamentos de que esses instrumentos legais carecem de legitimidade democrática, dada a criação de privilégios alcançáveis por alguns apenas na relação entre projectos de investimento promovidos por privados e a governação pública, mas também, assinalando a falta de legitimidade política dos membros da CAA-PIN, por não se sujeitarem ao escrutíneo do eleitorado, sendo por isso acusados de «politicamente imputáveis», olhando para uma lógica de que as suas decisões «actuarem sobre algo que é de utilidade para o país». Mas o ponto-chave, que provoca maior contestação, é que segundo estes deputados, os regimes citados permitem «dar licitude a algumas matérias que se encontram salvaguardadas por legislação própria», apontando como exemplo a legislação que se refere a recursos naturais, à qualidade do ambiente, ao planeamento e à gestão do território.

Assim, acusam os deputados que dentro das circunstâncias referidas será permitido a grandes projectos de investimento contornarem a legislação ambiental e de ordenamento do território em vigor, considerando que assim os grandes empreendimentos turísticos, enquanto principais utilizadores do regime dos PIN, conseguirão ter «acesso a locais mais agradáveis, quer do ponto de vista da qualidade ambiental quer do baixo valor dos solos, bem como têm oportunidade de ter altas rentabilidades num curto espaço de tempo», situações que levam a que os deputados refiram a sua incompatibilidade com a «protecção ambiental, o ordenamento do país e a qualidade de vida das populações», originando assim um modelo de turismo que os deputados classificam como «insustentável».

No âmbito do projecto de lei n.º 739/X/4ª, apresentado pelo Bloco de Esquerda, na 4ª sessão legislativa da X Legislatura, os autores referem que o «regime de excepção na articulação de projectos de investimento com a administração pública e os procedimentos legais e regulamentares existentes coloca logo à partida questões sobre a sua legitimidade», considerando que simultaneamente são criadas «condições de concorrência desleal» no âmbito do acesso ao investimento. Os autores aludem ainda para a possibilidade de «alguns dos projectos PIN que afectam áreas classificadas para protecção, cuja legislação não permite a construção de edifícios e infra-estruturas, muito menos com a dimensão e impacte que têm ao nível do ambiente e território» terem alcançado a sua viabilização e obtido um correspondente empenho por parte de várias entidades da administração pública. Apontam-se claramente questões de transparência, de legitimidade democrática das decisões e de igualdade de direitos dos cidadãos perante o Estado e no acesso à iniciativa privada e ao investimento.

Ainda é de referir que os deputados em causa classificam o regime dos PIN+ ainda mais gravoso, dado que permite um conjunto de prerrogativas a que estão sujeitos outros projectos, nomeadamente, possibilitando a dispensa da Avaliação de Impacto Ambiental (AIA), nos casos devidamente previstos na lei, e à constatação da importância do projecto para efeitos do regulamento jurídico da Reserva Ecológica Nacional.

Os representantes do povo aludem, ainda, ao facto de tanto projectos PIN e PIN+ receberem apoios financeiros do Estado, concedidos por meio directo ou através de benefícios fiscais, sem que haja um controlo efectivo e verificação das condições a que respeita a criação de postos de trabalho previstos no âmbito do projecto.

Na iniciativa legislativa apresentada pelo Bloco de Esquerda e que acima referi, os autores apresentam três exemplos de compexos turísticos ou imobiliários, que estão envoltos no processo de pré-contencioso contra o Estado Português por parte da Comissão Europeia, em Maio de 2008, por alegadamente este ter desrespeitado o direito comunitário, sendo eles os complexos da Herdade do Pinheirinho, da Costa Terra e da Herdade da Comporta, ocupando uma área de 1200 hectares com mais de 16000 camas, incluindo 6 campos de golfe, 21 aldeamentos turísticos, 660 moradias e 21 hóteis, em que todos os Estudos de Impacte Ambiental concluiram por impactes significativos sobre habitats prioritários, e o projecto do Tróia Resort composto por 2000 camas, implementado em zonas de domínio público hídrico e em partes dunares, tendo obtido parecer negativo da Comissão de Avaliação de Impacte Ambiental, e vários dos empreendimentos turísticos no Algarve, situando-se a sua localização junto ao Parque Natural da Ria Formosa, afectarão zonas de Reserva Ecológica e Agrícola Nacional e importantes zonas de floresta. É, importante referir que a Comissão Europeia, nas conclusões que apresentou sobre o processo de pré-contencioso refere que as avaliações de impacte ambiental dos citados empreendimentos turísticos «apresentam graves deficiências», nomeadamente, por constituirem uma grave ameaça sob espécies prioritárias da rede Natura 2000, concluindo que tal se deveu ao «procedimento acelerado» a que conduziu a classificação dos projectos referidos como PIN.

Um outro argumento invocado pelos autores é a falta de transparência em que se reveste os procedimentos de classificação de projectos como PIN, sendo que as regras de publicitação e de consulta pública no âmbito desse regime jurídico constam do Decreto-Lei n.º 157/2008, de 8 de Agosto, em que se articula os procedimentos de publicitação e de consulta pública aplicável aos projectos PIN, sendo também o diploma aplicável, com as devidas adaptações, aos procedimentos que se encontrem em curso, no entanto, quanto aos já iniciados, o diploma prevê que a Câmara Municipal possa dispensar a consulta pública às operações de loteamento decorrentes de projectos PIN ou a Assembleia Municipal, nos casos em que tal dispensa resultar de regulamento municipal.

Também o Partido Comunista Português, na esteira do defendido pelo Bloco de Esquerda, veio apresentar uma iniciativa legislativa, em 25 de Fevereiro último, com a finalidade de interditar o uso de solos incluídos em Reserva Ecológica e Agrícola Nacional para o desenvolvimento de projectos de natureza imobiliária e ainda uma reversão para o Estado daqueles projectos cujos critérios que fundamentaram as suas classificações não foram respeitados escrupulosamente, incluindo nessa reversão a parte que corresponde aos terrenos envolvidos, rejeitando qualquer tipo de indemnização e aplica o regime fiscal de mais-valias aos terrenos sitados em REN e RAN que tenham sido valorizados através da classificação como projectos PIN e PIN+.

4. Análise do conflito entre a celeridade a dar aos processos relativos a projectos PIN e PIN+ e a protecção ambiental

Uma das primeiras constatações do regime dos projectos PIN está no conjunto de excepções que a justificação de que problemas burocráticos, de processos longos e arrastados para obtenção de licenciamento e de articulação díficil entre diversos organismos da administração pública directa e indirecta, levam a que o desenvolvimento económico, social e territorial com eles não se compadeça.

Se, por um lado, é importante garantir o acesso ao investimento, à promoção do desenvolvimento económico e social, a diminuição de assimetrias regionais e o aproveitamento do investimento privado como forma de criação de emprego e de riqueza, por outro, a preservação do ambiente e dos recursos naturais não deixa de ser, também, e pelos valores em causa, alvo de fundamental cuidado e atenção.

Tal como definiu a Comissão Europeia nas conclusões do processo de pré-contencioso movido contra o Estado Português em Maio de 2008, a existência de um conjunto de procedimentos mais céleres conduziu a um «procedimento acelerado» que teve como consequência que as avaliações de impacte ambiental em causa fossem dotadas de várias e graves deficiências.

Ora vejamos que a decisão de reconhecimento de um projecto como PIN, está indicada pela lei para que aconteça num «mais curto prazo possível» que não pode exceder um prazo máximo de «30 dias úteis» que se contabilizam a partir da entrega do requerimento a pedir a classificação e reconhecimento do projecto enquanto PIN, o que contrasta e muito com outro tipo de processos que envolvem a administração pública que se arrastam anos e anos.

Mais grave é que estamos na presença de projectos que pelas suas características representam um volume de investimento superior a 25 milhões de euros, que por análise lógica se concluirá que quanto maior é o investimento também maior será o nível de intervenção a que o mesmo conduzirá.

Assim, parece de dizer que há um choque claro entre, por um lado, a promoção da celeridade processual nos actos administrativos de licenciamento destes projectos, ainda que defensável pelo conjunto de carga burocrática e pelas dificuldades de organização dos próprios serviços públicos no sentido de poder produzir uma resposta adequada e em tempo útil aos pedidos que lhe são dirigidos. Parece, no entanto, no que respeita à legislação em aplicação antes dos regimes dos projectos PIN e PIN+, que o apontamento de falhas pela enorme dificuldade na cooperação institucional dos diversos organismos dever-se-ia ultrapassar pela mesma via que foi estabelecida no âmbito deste regime, nomeadamente, através do dever de necessária cooperação institucional entre as entidades públicas envolvidas. À semelhança do que aconteceu quanto aos regimes jurídicos dos instrumentos de gestão territorial, que padeciam de problemas sérios quanto ao funcionamento ou inoperacionalidade das comissões de acompanhamento, a aposta numa redução significativa do seu papel, na mesma lógica que presidiu a uma diminuição significativa de prazos nos regimes dos projectos PIN e PIN+, não só se apresenta como perigosa para a protecção ambiental e dos recursos naturais, por não permitir um estudo adequado e ponderado, em várias linhas, dos projectos em si e das consequências e efeitos que os mesmos poderão produzir, como ainda, conduz à sobrevalorização de interesses ligados ao investimento e à obtenção de lucro, ao contrário do que poderia ser mais valorizado, como é a preservação ambiental e dos recursos endógenos.

Parece tanto mais grave quanto as garantias de celeridade são de certo modo colocadas como principal motivo que levam à criação de processos mais rápidos e de resposta em curto espaço de tempo, sem que tal devidamente se preocupe em garantir ao mesmo tempo e em simultâneo a protecção do ambiente e contribuir para o desenvolvimento económico. Em suma, em pouco tempo procedeu-se a uma passagem de uma situação de excessiva burocracia para uma situação onde existe maior facilitismo e menor exigência quanto à produção de decisões conscientes em razão do tempo disponível para as ponderar. Como disse, tal é tanto mais grave, quando um dos objectivos que justificam e impelem a que estas alterações tenham sido produzidas, que é o desenvolvimento económico, social e regional, não tenha um conjunto de mecanismos adequados de fiscalização, acompanhamento e monitorização, de modo a efectivar o seu cumprimento.

5. Um olhar sobre as falhas legislativas e práticas seguidas nestes procedimentos

Cumpre ainda apreciar algumas falhas legislativas a respeito destes dois regimes e as práticas que têm sido seguidas no âmbito do reconhecimento de projectos enquanto PIN e PIN+.

Parece de todo o modo evidente que falha redondamente o regime jurídico ao conduzir a que as decisões do órgão que profere a classificação não sejam alvo de escrutíneo público, através de publicitação da fundamentação a que conduziu à sua classificação. Numa era de elevado desenvolvimento tecnológico e de introdução das novas tecnologias no âmbito da sociedade da informação e da governação electrónica, parece aceitável que, ponderados os devidos dados que digam respeitam ao processo de negócios em que se envolve este tipo de projectos, na lógica do “o segredo é a alma do negócio”, se obrigue à publicitação na Internet não só dos dados que actualmente se obriga mas também à fundamentação e aos passos dados em toda a tramitação destes processos.

É, ainda, necessário, como referi anteriormente, promover um conjunto de mecanismos que de modo efectivo levem ao cumprimento das condições ligadas à criação de emprego nos projectos classificados. Uma vez que essa, pode-se entender, será a contrapartida pela obtenção de um procedimento mais célere, então, justifica-se plenamente que a sujeição de interesses públicos a interesses privados seja compensada por uma atitude de exigência e de cumprimento escrupuloso dos compromissos assumidos no âmbito da classificação dos projectos, nomeadamente, através de acções fiscalizadoras, que permitam ao mesmo tempo, assegurar que motivações do ponto de vista da situação económica e da viabilidade do projecto não constituem falsas justificações para o incumprimento dos compromissos celebrados pelos privados.

Parece ainda de reforçar uma ideia, em que o regime de tributação de mais-valias perante terrenos que têm preços consideravelmente baixos e que por força da classificação de projecto PIN ou PIN+ conduzem à possibilidade de realização de investimento nesses espaços e que de outro modo não seria permitido. Uma vez que tal constitui, de facto, numa valorização patrimonial, tal merece que, considerando certos limites e dada a necessidade de investimento e a premência desse tipo de iniciativas empreendedoras, sejam taxadas mais-valias perante esses incrementos patrimoniais.

Ainda parece de em face das conclusões tomadas pela Comissão Europeia levar a que os projectos alvo de classificação e que tenham necessidade de superar a avaliação de impacte ambiental, seja possível garantir que o conjunto de informação técnica e procedimental para a tomada de uma decisão não seja acente em «pés de barro», nomeadamente, através de uma alteração aos prazos actualmente fixados, de modo a não promovendo um retorno aos modelos antigos, se encontre uma situação de meio termo de modo a não esquecendo a necessidade de desenvolvimento económico, promover de forma clara a preservação da natureza, garantindo assim o futuro.

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