segunda-feira, 17 de maio de 2010

O novo regime jurídico da licença ambiental

1. Introdução ao novo regime jurídico da licença ambiental

A licença ambiental foi introduzida na ordem jurídica portuguesa pelo DL 194/2000, de 21 de Agosto e é um dos instrumentos jurídicos mais relevantes e centrais no Direito do Ambiente, não só pela relevância dos seus princípios estrututantes na criação de regimes jurídicos, como também nos procedimentos administrativos com impacto na vida dos cidadãos e destinados a tutelar os seus direitos fundamentais.
A licença ambiental representa a coroação de diversos impulsos constitucioanis e comunitários ao determinar o estabelecimento de medidas destinadas a evitar ou pelo menos a reduzir as emissões de poluentes: isto significa que é um elemento indispensável das políticas públicas de prevenção e combate integrado à poluição.
Apesar da aprovação deste DL só ser feita em 2000, a sua necessidade fazia-se sentir desde a década de 80 e na Lei de Bases do Ambiente (L 11/87, de 7 de Abril), que determinava a sua existência, enquanto “instrumento de política de ambiente” (art 27/1/hº). De facto, o art 66/2/aº CRP vem elencar precisamente a prevenção e controlo da poluição e dos seus efeitos, como no topo das tarefas do Estado a nível ambiental.
A esta imposição constitucional, há que acrescer ainda o Direito da União Europeia. Em primeiro lugar através da previsão no Tratado da Comunidade Europeia da necessidade de prevenção, controlo e eliminiação da poluição, sendo esta última na medida do possível. Em segundo lugar, com influência decisiva, da aprovação do DL 194/2000, esteve a Directiva 96/91/CE, do Conselho, de 24 de Setembro. Assim sendo, não admira, que esta directiva comunitária, tenha sido um dos impulsos decisivos para a célere reforma legislativa empreendida com a aprovação do novo diploma regulador da licença ambiental, o DL 173/2008, de 26 de Agosto. Através das diversas alterações substanciaias a que a directiva foi sendo submetida ao longo dos anos, procedeu-se à codificação do regime jurídico da prevenção e controlo integrado da poluição num novo diploma, a Directiva 2008/1/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 15 de Janeiro de 2008.
Ainda assim, os impulsos legiferantes do novo regime não se esgotam no enquadramento jurídico comunitário, havendo que referir um importante desiderato com raízes internas: os programas e objectivos de simplificação e modernização administrtiva, nomeadamente no quadro da revisão dos procedimentos de acesso a actividades económicas sujeitas a licenciamento, no quadro do SIMPLEX.
Para além da necessidade de adequar o regime da licença ambiental à aprovação da Directiva 2008/1/CE (o que podemos ver através da análise no preâmbulo), o legislador nacional pretendeu ainda imprimir maior celeridade e eficiência aos procediemtnos de concessão de licenças ambientais, particularmente no que respeita à sua articulação com outros procediemtnos administrativos para licenciamento ou autorização de instalações. O diploma refere expressamente o desiderato de harmonizar as soluções com os regimes de exercício da actividade industrial (REAI) e da actividade pecuniária (REAP) que vieram também a ser revistos no quadro do mesmo pacote legislativo reformador.

2. Considerações iniciais gerais
2.1 A licença enquanto condição de exploração de instalação

A primeira alteração no quadro do novo regime jurídico da prevenção e controlo integrado da poluição respeita ao próprio conceito de licença ambiental, uma vez que o diploma procede a uma alteração significativa da definição constante no art 3º, com implicações substantivas de vulto. Ao contrário do que constava da redacção do DL 194/2000, que definia a licença como “a decisão escrita que visa garantir a prevenção e o controlo integrados da poluição preveniente das instalações abrangidas pelo presente diploma (...), constituindo condição necessária do licenciamento ou autorização dessas instalações”, a nova redacção passou a prever que a licença ambiental se torne uma “mera condição necessária da exploração” das novas instalações. Podemos considerar esta uma alteração vantajosa na relação do particular com a Administração Pública, uma vez que poderá permitir avançar com os restantes procedimentos de licenciamento necessários à concretização do projecto sujeito a licença ambiental, e através da redacção anterior só era possível depois da emissão da licença. Com a desburocratização poderá o particular sair beneficiado desta alteração legislativa. Há desvantagem para o particular, uma vez que a incerteza a que fica sujeito quanto ao futuro do seu empreendimento aumenta consideravelmente, podendo redundar numa situação em que já realizou um investimento avultado e se vê impedido de iniciar a exploração de uma instalação praticamente concluída por só nesse momento ter constado a impossibilidade de concluir o licenciamento ambiental. Isto significa que há um aumento do risco para o operador.
Na sequência desta alteração do conceito de licença ambiental, são diversas as disposições do diploma que passam a conformar-se com a nova realidade, ao que o art 9/2º vem afirmar que a licença ambiental é parte integrante da decisão emitida pela entidade coordenadora (EC) do procedimento global quanto ao início da exploração, deixando pois de ser a licença ambiental condição de emissão de licenciamento ou autorização da actividade em causa (art 22/1º DL 194/2000). O novo regime vai mais longe e afirma expressamente que a decisão sobre o pedido de autorização de instalação pode ser proferido antes da decisão final do procedimento da licença ambiental, reafirmando que esta é apenas indispensável no inicio da exploração da instalação. Ou seja, o legislador insiste na possibilidade de, na iminência de iniciar a actividade que já viu licenciada, o particular se pode confrontar com uma decisão negativa em sede de prevenção e controlo integrado da poluição. As consequências desta construção pode acarretar mesmo interrogações sérias quanto a uma eventual responsabilidade da Administração nos casos em que se permite um investimento de confiança pelo particular que, em boa fé, conta com a possibilidade de dar início à actividade do seu novo empreendimento em que realizou avultados investimentos, e se vê confrontado com um obstáculo inultrapassável de última hora. A natureza de uma autorização de exploração deve prender-se com a verficação da conformidade do projecto executado com aquilo que constitui o objecto do procedimento de licenciamento, não devendo ficar remetida para essa fase a análise de elementos essenciais à conformidade da instalação com o normativo aplicável. O DL 173/2008 manteve a consequência da nulidade de todas as decisões proferidas na falta de licença ambiental ou após o respectivo deferimento tácito (art 9/4º), pelo que a única via aberta para o particular passará necessariamente pela realização de alterações à instalação, que pode bem já estar concluída e a aguardar a emissão da única licença ainda em falta.

2.2 Âmbito de aplicação da licença ambiental

No que respeita à definição de instalação os conceitos permanecem inalterados no novo diploma (art 2/hº), mas há uma importante alteração do âmbito de aplicação do regime jurídico da prevenção e controlo integrado da poluição no que respeita às alterações substanciais das instalações.
Na redacção da nova lei, passa a ser considerada alteração substancial “qualquer modificação ou ampliação de uma instalação que seja susceptível de produzir efeitos nocivos e significativos nas pessoas ou no ambiente ou cuja ampliação, em si mesma, corresponda aos limiares estabelecidos no anexo I (art 2/bº), o que acarreta um alargamento do conceito. Se na versão anterior da lei era sempre necessário que a alteração ou ampliação, em si mesma, correspondesse aos limiares do anexo I, na nova redacção basta depararmos com uma alteração a uma instalação susceptível de produzir efeitos nocivos e significativos para activar o regime de sujeição a nova licença ambiental. Esta é a segunda alteração neste novo regime jurídico.
Ainda quanto ao âmbito de aplicação do regime, e como terceira alteração em relação ao regime anterior, há uma benfeitoria em sede de técnica legislativa, com a colocação de alguns aspectos anteriormente perdidos nos anexos do DL, respeitantes à exclusão das instalações destinadas a investigação, desenvolvimento ou experimentação, enquanto o art 4º regula o procedimento de exclusão do regime de licença ambiental a pedido do particular. É de saltar à vista a densificação do procedimento a adoptar para o efeito, e o reforço de garantias de acompanhamento da instalação por parte da Administração.

3. Entidades intervenientes

A quarta alteração diz respeito às entidades intervenientes. Quanto aos sujeitos do procedimento de emissão da licença ambiental, o novo diploma veio inovar quanto ao quadro normativo anterior, uma vez que reduziu as categorias de intervenientes principais a duas entidades, criando uma dicotomia de funções entre a EE e a Agência Portuguesa do Ambiente (APA). Assim sendo, saem as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional, que haviam sucedido às Direcções Regionais do Ambinte na sua tarefa de intermediárias entre a EC e o responsável pela emissão da licença (que era na altura o Instituto do Ambiente), ficando submetidas a um papel secundário, de apoio à realização da consulta pública (art 15º).
Quanto à intervenção da Comissão de Consulta para a Prevenção e Controlo Integrado da Poluição, esta conserva o seu papel de acompanhamento de aplicação da lei e monotorização da evolução das melhores técnicas disponiveis (MTDs), não se afastando o novo regime do figurino de competências que se encontrava dotada a comissão (art 8º DL 173/2008 em confronto com o art 7º DL 194/2000).
Quanto à fiscalização e inspecção cabia, no diploma anterior, à Inspecção Geral do Ambiente e do Ordnamento do Território (IGAOT) e às Administrações de Região Hidrográfica (AHR). Este elenco foi alargado ligeiramente, adequando-o à nova organização administrativa em matéria ambiental que resultou do Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado (PRACE), da nova lei orgânica do Ministério do Ambiente, do Ordenamento do Território e do Desenvolviemtno Regional (MAOTDR – DL 207/2006, de 27 de Outubro) e da nova Lei na Água (Lei 58/2005, de 29 de Dezembro).

4. Tramitação do procedimento
4.1 Fase prévia (em caso de alteração à instalação)

No caso de alteração à instalação, o art 10º passa a prever com maior detalhe quais os prazos aplicáveis após a comunicação pelo operador à EE de que pretende proceder a alterações à instalação (quinta alteração). O que acontece nesta fase?
1º- comunicação do operador à EE de que pretende proceder a alterações à instalação
2º- A EE fica então obrigada a remeter a proposta à APA. A remissão deve ser feita no prazo de 3 dias (desaparecendo a intermediação das CCDRs)
3º- A APA dispõe de 15 dias para se pronunciar se aquela é ou não uma alteração substancial, que necessita de novo licenciamento (art 10/2º)
4º- Caso seja uma alteração não substancial, a APA procede em 30 dias, se necessário, aditamento dos elementos relevantes à licença ambiental já emitida (art 10/3º)

4.2 Tramitação do pedido de licença ambiental
4.2.1 O pedido

O procedimento de atribuição da licença continua a desencadear-se mediante a apresentação do respectivo pedido pelo operador junto da EE, permanecndo inalterada a solução do regime anterior (art 11/1º DL 173/2008, art 18/1º DL 194/2000). Relativamente aos elementos do pedido são praticamente os mesmos embora haja uma novidade: a possibilidade de entrega simultânea de dados relativos a outros procedimentos autorizativos em matéria ambiental (e temos a sexta alteração). Neste caso as alíneas m) e n) do art 11/1º configuram dois conjuntos distintos de situações:
- no primeiro, vemos duas situações de articulação facultativa entre procedimentos administrativos em matéria ambiental. Devem ser entregues os dados relevantes para a apreciação do pedido de título de ermissão de gases com efeito de estufa e de dados relevantes para o pedido de título de utilização de recursos hídricos, quando o operador optou por apresentar estes pedidos em simultâneo, nos termos dos art 25/2º e 26º, respectivamente;
- no segundo, vemos outras duas realidades sujeitas a uma eventual articulação com o procedimento de licenciamento ambiental, nos termos do art 12º, a saber, nos casos de sujeição da instalação a AIA (avaliação de impacto ambiental) ou ao regime de prevenção de acidentes graves que envolvam substâncias perigosas. Os regimes aplicáveis variam consoante os procedimentos em causa:
1. em regra, no caso de instalação sujeita a AIA, o pedido de licença ambiental é entregue após:
a) emissão de declaração de impacto ambiental (DIA) favorável ou condicionamento favorável, se a AIA em fase decorrer em fase de projecto de execução;
b) emissão de parecer relativo à conformidade do projecto de execução com a DIA, se a AIA decorrer em fase de estudo prévio;
c) decisão de dispensa de procedimento de AIA;
d) decurso do prazo necessário para deferimento tácito nos termos do regime da AIA
Porém, nos termos do art 12/3º, pode o perador optar por desencadear em simultâneo os procedimentos de licenciamento ambiental e de AIA, desde que este seja relativo a um projecto de execução.
2. Já no caso de uma instalação sujeita ao regime jurídico de prevenção de acidentes graves que envolvam substâncias perigosas, o pedido de licença ambiental é entregue após:
a) emissão de parecer favorável da APA à localização;
b) aprovação do relatório de segurança, nos termos do respectivo regime jurídico
Neste caso também, pelo art 12/3º, pode o operador optar por desencadear em simultâneo os procedimentos de licenciamento ambiental e de prevenção de acidentes graves que envolvam substâncias perigosas.

O art 11/2º vem ainda introduzir um instrumento relevante para a realização do desiderato da economia procedimental e do princípio da cooperação entre a Administração e os particulares, pois permite ao operador remeter os elementos solicitados no nº1 para informações que ele saiba estarem já na posse da própria Administração.

4.2.2 A instrução do pedido

O novo regime jurídico vem restabelecer os prazos procedimentais aplicáveis à instrução do pedido pela APA, tendo esta 15 dias para proceder à verificação da presença da totalidade dos elementos necessários (art 13/1º). Nesse período de tempo, a APA pode ainda convocar o operador, mantendo informada a EC, para que este participe em conferência instrutória, na qual são abordados os aspectos considerados necessários, com vista a uma melhor apreciação do pedido (art 13/3º). Não havendo conformidade do pedido com os requisitos legais, a APA poderá enveredar por uma de duas alternativas:
a) no caso da falta ser suprível, recorre à EC, no prazo de sete dias a contar da data em que o pedido foi a si remetido, a prestação pelo operador de informações ou elementos complementares (art 13/2/aº) ficando o operador dotado de 45 dias para corrigir ou complementar o pedido (art 13/4º). Neste caso, suspende-se automaticamente o prazo para a decisão da licença ambiental (art 13/5º);
b) no caso de ser insuprível, procede ao indeferimento liminar do pedido, caso verifique que há impossibilidade de suprimento ou correcção dos elementos em falta (art 13/2/bº). O indeferimento terá ainda lugar se os elementos aditados ao abrigo da faculdade de correcção concedida ao operador não forem suficientes para afastar as defeciências detectadas.
Caso não ocorra nem o indeferimento liminar, nem a abertura de período de correcção do pedido, entende-se que este se encontra correctamente instruído (art 13/7).

4.2.3 Avaliação técnica

O novo diploma mantém-se fase ao regime anterior, não sendo de notar quaisquer alterações.

4.2.4 Acesso à informação e participação do público

Esta fase representa um dos domínios em que o regime do licenciamento ambiental tem vindo a enriquecer com o fortalecimento da tutela dos direitos fundamentais de participação dos particulares. Já em 2005 houve um reforço desta componente em matéria de direitos de participação procedimental e de acesso à informação.
O DL 173/2008 remete a disciplina desta fase do procedimento para o seu art 15º, que corresponde, no essencial, ao modelo herdado do regime jurídico anterior:
a) os elementos a divulgar pela APA são praticamente os mesmos do regime anterior (art 15/2º);
b) a forma de publicação é a mesma: por anúncio em jornal de circulação nacional, regional ou local, associado a fixação de edital na CCDR ;
c) apresentação das ibservações e sugestões por escrito (art 15/5º).
A oitava alteração diz respeito à diminuição do prazo de disponibilização ao público dos elementos referidos, que passa de 15 e 30 dias, para 15 e 20 dias, consoante o projecto esteja ou não sujeito a procediemtno de AIA (art 15/4º). Assim, para os projectos não sujeitos a AIA, o legislador subtraiu 10 dias ao período de participação pública, dificultando ainda mais a formulação de contributos e uma análise ponderada por parte da comunidade.
Para elém desta diminuição quantitativa da participação, atenta a referida possibilidade de apresentação simultânea dos pedidos de AIA e de licença ambiental, o art 15/8º vem ainda determinar que, nesses casos, a participação pública de ambos os procedimentos deva também ocorrer em simultâneo. Esta solução devia sofrer reparos, uma vez que nada contribui para reforçar a qualidade e a quantidade da participação.

4.3 A decisão final

Trata-se de um dos aspectos do diploma em que o legislador introduziu mais e mais significativas alterações no quadro normativo vigente.

4.3.1 Prazos

A decisão final deve ser dirigida à considerável redução de prazos operada pelo novo diploma. A configuração geral em matéria de prazos manteve a opção herdada do DL 194/2000 de distinguir um prazo de decisão nos casos em que não houve lugar a AIA, daqueles casos em que o projecto tenha sido submetido a prévia AIA. Assim, o prazo geral, sem que tenha havido AIA, passa a ser de 75 dias (art 16/1º), onde se pode ver uma redução de 15 dias face ao regime anterior. Já os casos em que houve AIA passou de 60 para 55 dias, havendo uma redução de 5 dias (nona alteração). Há uma novidade introduzida pelo novo diploma, que se traduz na redução para metade dos dois prazos referidos nos casos em que o pedido da licença ambiental tenha sido validado por entidade acreditada (art 16/3º). A introdução da figura das entidades acreditadas é uma das principais inovações da revisão do regime jurídico da licença ambiental (décima alteração), encontrando a sua principal sede na norma que define a noção de entidade acreditada (art 2/fº): entidades acreditadas são aquelas “entidades reconhecidas formalmente pelo Organismo Nacional de Acreditação, do domínio do Sistema Português de Qualidade, com competência para realizar actividades específicas no âmbito do pedido de licença ambiental”. Porém, não se desenvolvem os critérios de reconhecimento e o respectivo procedimento, pelo que até à definição desses elementos o aplicador está condenado a ficar na expectativa quanto ao verdadeiro alcance desta disposição.
O novo diploma debruça-se sobre o prazo aplicável aos casos de tramitação simultânea dos procedimentos de AIA ou de prevenção de acidentes graves com substâncias perigosas, por um lado, e de pedidos de licenciamento ambiental, por outro. O art 16/4º determina que nesses casos o prazo relevante conta-se a partir da emissão da declaração de impacto ambiental ou da emissão de parecer de localização ou da aprovação do relatório de segurança. Em qualquer dos casos, o prazo em questão será de 10 dias. Estes não deixam de se apresentar como escassos, particularmente nos casos de maior complexidade.
Ainda no que respeita aos regimes especiais dos prazos, deve referir-se a realidade patente no art 16/4º em relação aos casos em que seja necessário título de recursos hídricos para exploração da instalação e este não seja emitido até ao termo dos prazos gerais do art 26/1º e 2º, em cujo caso a decisão sobre a emissão da licença ambiental é proferida no prazo de três dias após a recepção do título de utilização de recursos hídricos pela APA.
O único traço positivo parece ser o da eliminação da anterior previsão do DL 194/2000, que admitia que, mediante despacho do membro do Governo com competência na área do Ambiente, poderia ainda ter lugar uma redução excepcional dos prazos gerais.
E há compatibilidade com os novos prazos fixados para as diversas fases do procedimento de licenciamento ambiental? Começando pela recepção do pedido, deparamos com 15 dias para a APA proceder à sua apreciação. Admitindo que não há solicitação de elementos complementares nem indeferimento liminar, passamos à fase de avaliação técnica do pedido, que pode ocorrer simultaneamente com a participação do público. Assim sendo, admitamos que se trata de um projecto previamente submetido a procedimento de AIA, depararemos com um prazo de 15 dias para a discussão pública.
Tendo em conta que se trata de procedimento submetido a prévia AIA, o respectivo prazo final da decisão é de 55 dias, a contar da entrada do pedido na APA. Cumprindo-se todos os prazos, as fases intermédias demorariam pelo menos 30 dias, pelo que haveria tempo para a decisão final. Mas no caso de o pedido de licença ser validado por uma entidade acreditada, o prazo fica reduzido para 23 dias. Neste caso não sobram dias para uma decisão final ponderada. Uma leitura possível seria a redução de prazos das sub-fases do procedimento, contudo, tal não tem apoio na letra da lei e prejudicaria o procedimento.

4.3.2 Critérios de decisão

Neste campo há também algumas alterações. O diploma anterior limitava-se a remeter genericamente para o incumprimento dos “requisitos do presente diploma, nomeadamente os princípios gerais mencionados no art 8º” ou para o incumprimento de critérios formais, ou seja, a falta dos elementos que deviam obrigatoriamente constar do pedido de licenciamento (art 17º do antigo diploma).
O novo regime opta por um elenco mais completo de fundamentos de indeferimento. São fundamentos de indeferimento:
- a existência de DIA desfavorável nos casos em que o procedimento correu em simultâneo com a AIA (art 16/6/aº)
- parecer desfavorável à localização ou não aprovação do relatório de segurança no caso em que o procedimento correu em simultâneo com o procedimento do regime de prevenção de acidentes graves com substâncias perigosas (art 16/6/bº)
- indeferimento do pedido de título de utilização de recursos hídricos ou de título de emissão de gases com efeitos de estufa (art 16/6/cº)
- incapacidade da instalação atingir os valores limite de emissão constantes das disposições legais e regulamentares ambientais em vigor (art 16/6/dº)
- desconformidade das condições de exploração da instalação com as melhores técnicas disponíveis (MTDs), designadamente a incapacidade de atingir valores de emissão dentro da gama de valores de emissão associados a essas técnicas (art 16/6/eº)
- demais características e especificações da instalação descritas no pedido da licença ambiental que contrariem ou não cumpram condicionamentos legais e regulamentares em vigor e desde que tais desconformidades tenham relevo suficiente para a não permissão para o início da exploração da instalação (art 16/6/fº).

As primeiras três categorias reconduzem-se à necessária articulação do regime da licença ambiental com outros procedimentos obrigatórios, cuja avaliação negativa tem de pressupor uma resposta desfavorável nesta sede. As restantes categrias prendem-se com a avaliação do próprio licenciamento ambiental; porém há diferenças entre as três: no caso da alínea d) é um critério objectivo, assente na constatação da impossibilidade de cumprimento dos valores mínimos de emissão juridicamente vinculativos; o critério da alínes e) comporta uma maior margem de livre decisão por parte da Administração, uma vez que pressupõe a concretização das MTDs; o critério da alínea f) é o que tem o maior grau de abertura ao aplicador na determinação de im indeferimento do pedido de licença ambiental. A Administração sai aqui reforçada porque passa a beneficiar de uma maior margem de livre decisão.

4.3.3 Deferimento tácito

Consagrou-se que em caso de silêncio da Administração estamos perante um deferimento tácito. De facto o art 17/1º do novo diploma apassa a consagrar esta regra ao passo que o nº2 preceitua que deve a APA emitir e remeter ao operador certidão comprovativa do decurso do prazo para a emissão da licença ambiental.

5. Conteúdo da licença ambiental

O novo diploma vem introduzir uma alteração no tempo de duração: mantém o período máximo de 10 anos, mas eliminou o periodo mínimo, que era de 5 anos (art 18/2/gº). Apesar de parecer uma menor garantia de estabilidade para o particular, na realidade oferece uma solução menos rígida e mais conforme à mutabilidade considerável da evolução tecnológica e do conhecimento científico, susceptivel de acautelar o interesse público ambiental.

6. Força jurídica

O novo diploma não introduziu quaisquer alterações, uma vez que continua a prescrever a sua imprescindibilidade para a conclusão do procedimento autorizativo global, havendo nulidade no caso de quaisquer decisões relativas ao início da exploração proferidas sem que tenha sido emitida a licença. A leitura em relação à redacção anterior é diferente: a licença deixou de ser condição para o licenciamento ou autorização da actividade em causa, passando a mera condição de início da exploração da instalação; o deferimento tácito também veio alterar pois deixou de ser uma pronúncia expressa da Administração quanto ao pedido de licença, passando a ser suficiente o decurso do prazo da decisão (art 16/6º). A força jurídica da licença dá cobertura ao conteúdo do pedido do particular que, com algumas ressalvas, acaba por definir os termos do licenciamento.

7. Articulação com outros regimes jurídicos: avanços e técnicas

Nesta matéria apresentam-se diversas inovações e uma maior preocupação em assegurar a sua articulação, evitando os problemas identificados no quadro do normativo anterior. Para além das diversas disposições do diploma que procuram articular o regime da licença com os regimes de AIA e de prevenção de acidentes graves que envolvam substâncias perigosas há articulação de outros regimes, por força do capítulo III. Era preferível a adopção de uma única metodologia para proceder à articulação entre todos os regimes; assim, conforme esta redacção, estamos perante uma solução que tem alguns equívocos e obriga o interprete à consulta de vários artigos.

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