terça-feira, 13 de abril de 2010

Estrutura típica dos bens ecológicos

Os crimes dos art. 278º e 279º são crimes de dano. È evidente a natureza do crime de dano no art. 278º, ao exigir como seu elemento típico eliminar, destruir ou esgotar o objecto sobre o qual incide a acção e desse modo lesar gravemente os elementos considerados do ambiente natural, mas dúvidas já se têm suscitado relativamente ao crime do art. 279º cuja acção consiste na poluição das águas, solos ou do ar. O dano é a qualidade ambiental das águas, dos solos ou do ar e é essa qualidade que o crime visa tutelar mediante a incriminação das condutas que degradam efectivamente esses elementos da natureza.
O art. 279º, nº 1 exige como elemento constitutivo do crime um certo grau de poluição, em medida inadmissível, e o seu nº 3, define o que é a poluição em medida inadmissível: aquela que viola prescrições ou limitações impostas pela autoridade competente, em conformidade com disposições legais ou regulamentares e sob cominação de aplicação das penas previstas nos nºs 1 e 2 do mesmo artigo. A estrutura típica do crime do art. 279º é claramente de um tipo aberto, de um tipo em branco como lhe chama Germano Marques da Silva, pois o facto típico não é integralmente descrito no tipo legal incriminador, mas antes tem de ser completado, integrado, por prescrições ou limitações impostas pela autoridade competente.
Aparentemente a estrutura deste tipo de crime, seria a de um crime meramente formal, também denominado crime de desobediência, ou seja, desobediência às imposições da autoridade administrativa, independentemente do evento material.
Não basta a mera desobediência, é ainda necessário o evento material que consiste na degradação da qualidade da água, do solo ou do ar. A simples desobediência sem que a conduta cause o evento material, não constitui o crime do art. 279º por não se verificar a lesão do bem jurídico.
É também um tipo modal, pois este não se contenta com a produção do resultado típico, mas a lesão em determinadas circunstâncias, ou seja, após prescrições ou limitações impostas pela autoridade competente, em conformidade com disposições legais ou regulamentares e sob cominação da aplicação das sanções previstas na norma incriminadora.
Como adverte expressamente o Prof. Figueiredo Dias, a estrutura do art. 279º assenta na existência de um órgão que determina as condições exigíveis, donde que sem uma entidade competente emissora das prescrições e limitações não funciona o normativo. Não basta a violação dos regulamentos existentes e que integrem o tipo legal incriminador, é ainda necessária uma prescrição concreta por parte da autoridade administrativa competente sob cominação da sanção penal, ainda que necessariamente em conformidade com as disposições legais e regulamentares sem que a norma constante do art. 279º seria inconstitucional.
Devemos ter em conta que a prescrição administrativa constitui deste modo, um critério funcional de aferição da gravidade e em especial do desvalor da acção, ou seja, a acção é especialmente desvaliosa, a ponto de originar responsabilidade criminal, porque o agente não só polui, como polui depois de avisado pela administração para adoptar um comportamento que obviaria presumivelmente ao resultado e depois de avisado que o desrespeito das prescrições ou limitações o fariam incorrer em responsabilidade criminal.
A estrutura do crime do art. 279º do Código Penal é complexa. Como elemento constitutivo do crime, exige-se a existência de prescrições ou limitações impostas pela autoridade competente e a cominação das penas previstas nesse mesmo artigo. Compreende-se a remissão feita para as prescrições ou limitações das autoridades administrativas pois não é tecnicamente possível definir de forma estável e duradoura o grau de poluição da água, do solo ou do ar que exijam uma intervenção do direito penal.
A estrutura do crime de poluição previsto no art. 279º do Código Penal, aparece-nos inadequada, basta não haver cominação para que, apesar de se estar perante uma actividade poluidora à revelia de normas administrativas sobre a matéria, não se preenche o tipo.
Matéria diferente versa o crime do art. 278º que está tipificado com a estrutura clássica, embora do tipo penal em branco, enquanto é integrado por disposições legais ou regulamentares para que remete um tipo amplamente aberto, não só porque a norma penal em branco mas ainda que deixa ao intérprete o encargo de completar o tipo, embora dentro dos critérios por ele definidos.
Em suma, a razão da incriminação é a relevância dos bens jurídicos protegidos e a gravidade das sanções aplicáveis aos infractores das normas é justificada pela gravidade do dano e pelas consequências indirectas para a vida e saúde das pessoas. Não é especialmente importante a forma da estruturação típica dos crimes ecológicos como crimes de perigo ou de dano, mas é relevante que o legislador, afirmando a importância do bem jurídico tutelado, através da incriminação dos comportamentos danosos do meio ambiente tenha nesta fase sido suficientemente cauteloso para configurar como um crime de dano.

Pedro Pires
nº16342

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