terça-feira, 20 de abril de 2010

42. Embargos administrativos de ambiente: em busca de um conteúdo

Embargos Administrativos do Ambiente – Em busca de um conteúdo

I - Introdução
II - Análise do regime dos Embargos Administrativos
III – Situação actual dos Embargos Administrativos
IV – Conclusão
V - Bibliografia


I - Introdução

O direito fundamental ao ambiente e à qualidade de vida, consagrado no art. 66º CRP, compreende uma dimensão objectiva, que se consubstancia na atribuição de tarefas estaduais, as quais consistem na defesa da natureza e do ambiente – art. 9º, alínea c) CRP -, e uma dimensão subjectiva, que visa proteger os interesses dos particulares e considera-os como titulares de direitos subjectivos públicos. Por outro lado, o direito ao ambiente deve ser considerado como um “direito de defesa” perante os poderes estaduais face a actuações administrativas que sejam lesivas dos direitos dos particulares. Para além desta vertente negativa do direito ao ambiente, este também pode ser analisado sob o prisma de uma vertente positiva, que tem por base a necessidade de os poderes públicos procederem à prestação de medidas concretizadoras deste direito. Da consideração do direito ao ambiente como um direito fundamental e, portanto, como um direito subjectivo público, sucede a possibilidade da sua invocação directa no domínio das relações jurídicas administrativas – arts. 18º, nº1 e 17º CRP. As decisões administrativas em matéria ambiental produzem efeitos aptos a agredir os direitos de múltiplos sujeitos e, desta forma, são estabelecidas relações triangulares que são compostas, por um lado pelo Estado, e por outro por dois grupos de cidadãos: uns que são beneficiados pelo Estado e outros que são afectados de forma correspondente a tal benefício. Quando a administração autoriza uma entidade a exercer determinada actividade poluidora, o particular lesado não contesta o titular da licença administrativa, mas sim o Estado que autorizou tais comportamentos, ou seja, o particular reage contra a licença administrativa, não contra o seu titular. Com o objectivo de proteger as posições jurídicas de vantagem dos particulares, a lei prevê direitos de intervenção no procedimento administrativo – art. 53º, nº2, alínea a) do CPA -, bem como a tutela judicial efectiva. O direito ao ambiente comporta a possibilidade de defesa contra quaisquer comportamentos lesivos produzidos não só pelas entidades públicas mas também pelas privadas, de acordo com os arts. 17º e 18º da CRP, dada a natureza análoga do direito ao ambiente aos direitos, liberdades e garantias na sua dimensão negativa. O grau de vinculação pelo direito ao ambiente em relação aos sujeitos privados não tem a mesma intensidade que a que é imposta aos sujeitos públicos. Tal vinculação não pode oprimir a liberdade e autonomia individuais, portanto é necessário distinguir consoante se verifique uma “vinculação a título principal”, que onera as entidades privadas dotadas de poder e sujeitas a um dever activo de cooperação com os particulares que perante aquelas podem invocar direitos fundamentais, ou uma “vinculação a título secundário”, que obriga qualquer sujeito a respeitar os direitos fundamentais nas esferas interprivadas e que se baseia num dever geral de respeito. E com a finalidade de tutelar os direitos subjectivos das relações jurídicas no domínio ambiental, a Lei de Bases do Ambiente, no art. 42º, contempla um meio de garantia denominado por “embargos administrativos”.

II - Análise do regime dos Embargos Administrativos

O art. 42º da Lei de Bases do Ambiente prevê que todos “aqueles que se julguem ofendidos nos seus direitos a um ambiente sadio e ecologicamente equilibrado poderão requerer que seja mandada suspender imediatamente a actividade causadora do dano, seguindo-se, para tal efeito, o processo de embargo administrativo”. Este preceito suscita vários problemas de interpretação que influenciam a determinação do seu conteúdo e respectivo regime jurídico. Em primeiro lugar, cumpre saber se os embargos administrativos consubstanciam-se numa forma de actuação da administração ou num meio jurisdicional. A lei fomenta considerações contraditórias a este respeito, uma vez que enquanto a designação “embargos administrativos” conduz à aparência de que está em causa um meio administrativo, por outro lado o art. 45º alude a um meio processual. Tal como explica o Professor Freitas do Amaral, “não há nenhum processo de embargo administrativo que seja da competência dos tribunais (…): ou há embargos administrativos, que são da competência da Administração activa, ou há embargos judiciais, que são da competência dos tribunais”. O art. 42º deve ser alvo de uma interpretação correctiva, de forma a considerar que a sua expressão legal não se identifica com um procedimento administrativo mas sim com um processo judicial, pois a lei confere os “embargos do ambiente” à competência de um tribunal. Os “embargos do ambiente”, apesar de estarem previstos na Lei de Bases, não foram regulados nem concretizados por legislação posterior. Assim, e caracterizado este meio processual como específico de tutela do ambiente, cuja concretização se verifica incompleta, torna-se necessário tomar uma de duas opções: ou se entende que aquele meio apenas se tornará efectivo quando for completamente regulado, ou se pretende fazer corresponder os “embargos do ambiente” a um meio contencioso pré-existente, com o objectivo de garantir a imediata tutela dos direitos subjectivos em matéria ambiental. A segunda opção é a mais correcta, uma vez que procura salvaguardar a tutela judicial plena e efectiva dos direitos subjectivos dos particulares e adopta uma interpretação da expressão em análise conforme à Constituição – arts. 17º, 18º, 20º, 268º, nos 4 e 5 CRP. Um segundo problema consiste em precisar se os “embargos do ambiente” constituem um meio processual do contencioso administrativo ou do processo civil. O disposto no art. 45º, nº1 aponta no sentido da segunda opção: efectivamente, e tendo em conta a anterior formulação do art. 45º, que atribuía o conhecimento das acções a que se referem os embargos do ambiente à competência dos tribunais comuns, os embargos “administrativos” são considerados como um meio processual do processo civil. Nesta sede também é levantada a dúvida acerca da natureza dos “embargos do ambiente” como um meio principal ou acessório, ou seja, se consistem numa acção ou numa providência cautelar. Apesar do art. 45º, na sua anterior redacção, dirigir-se ao meio processual como uma “acção, o pedido do particular nestas circunstâncias é o da “suspensão imediata” da conduta que provoca o dano ambiental – art. 42º -, portanto, este meio processual consiste numa providência cautelar destinada a proporcionar uma tutela provisória, e não definitiva, ao direito ao ambiente.
Os “embargos administrativos” possuem, assim, as seguintes características:

a) Elementos processuais
i. Sujeitos activos (lesados) – são os titulares do direito ao ambiente, ou de quaisquer direitos subjectivos abrangidos numa relação jurídica pública ou privada, bilateral ou multilateral;
ii. Sujeitos passivos – são quaisquer entidades públicas ou privadas que provoquem um dano ambiental;
iii. Pedido – consiste na suspensão imediata do comportamento perigoso para o ambiente;
iv. Causa de pedir – consiste no direito subjectivo lesado que é alegado pelo particular.

b) Pressupostos processuais
i. Competência – de acordo com a anterior redacção do art. 45º, a competência para o conhecimento dos embargos administrativos cabia aos tribunais comuns.

Uma vez que a regulação deste meio processual não é concretizada em legislação específica posterior, torna-se imprescindível corresponder a previsão legal daquele à de um outro meio contencioso pré-existente, com recurso a uma interpretação conforme à Constituição, de modo a não inutilizar os “embargos do ambiente”. Antes da reforma do processo civil, a doutrina já dividia-se acerca da figura cuja regulação devia subsumir-se à dos embargos do ambiente. O Professor Freitas do Amaral considerava como solução a adoptar nesta sede, a recondução da previsão dos embargos “administrativos” ao procedimento cautelar de embargo judicial de obra nova, previsto nos arts. 412º e segs. do CPC. O legislador, ao utilizar a expressão “embargos administrativos”, procura atribuir ao lesado o direito de recorrer ao processo especial de embargo judicial de obra nova, e o gozo dum regime mais favorável que neste processo detém a Administração. Assim, os particulares cujos direitos subjectivos ao ambiente sejam lesados podem tirar partido do meio processual de embargo de obra nova sem quaisquer limitações de prazo, como se fossem uma autoridade pública – art. 413º, nº2 do CPC. Contudo, a recondução da previsão legal dos ditos embargos à regulação do embargo de obra nova levanta alguns problemas de compatibilização:

1. Enquanto o embargo de obra nova tem por finalidade a tutela dum direito real, o embargo do ambiente visa proteger os direitos subjectivos em matéria ambiental, que consubstanciam-se em direitos de natureza diferente. Os direitos subjectivos susceptíveis de serem tutelados em matéria ambiental são, em regra, relativos, pois consistem em direitos a uma concreta acção ou omissão por parte de entidades públicas ou privadas, no âmbito de relações obrigacionais de natureza bilateral ou multilateral;

2. O embargo de obra nova visa suspender uma construção, enquanto que o embargo do ambiente prossegue a imediata cessação de uma actividade poluente;

3. A versão originária do art. 414º, nº1 do CPC, anterior à reforma do processo civil, colocava outra dificuldade na compatibilização das duas figuras ao proibir o embargo de obras do Estado ou de autarquias locais. Deste modo, o embargo de obra nova apenas poderia ser prosseguido no âmbito das relações jurídico-privadas, e não das jurídico-públicas, de direito do ambiente.

Com vista a resolver este último problema, o Professor Gomes Canotilho defendia a conjugação das normas do CPC com as da Lei das Associações de Defesa do Ambiente (Lei nº 10/87, de 4 de Abril), nomeadamente com a norma que confere a tais associações legitimidade para “propor acções necessárias à prevenção ou cessação de actos ou omissões de entidades públicas ou privadas que constituam factor de degradação de ambiente” – art. 7º, nº1, a) do referido diploma. Portanto, Gomes Canotilho entendia que, com recurso a tal conjugação, passaria a ser possível a utilização do embargo de obra nova em matéria ambiental, mesmo relativamente a actuações do Estado ou de autarquias locais, com fundamento jurídico-legal nos preceitos da Lei de Bases do Ambiente e da Lei das Associações de Defesa do Ambiente. O Professor Vasco Pereira da Silva não concorda com tal posição uma vez que esta conduz a uma solução “contra legem”: além dos mencionados problemas de compatibilização entre os dois meios processuais, o referido art. 7º, nº1, a) limita-se a atribuir legitimidade processual às associações de defesa do ambiente, e não se pode retirar do seu conteúdo que haja qualquer permissão do funcionamento do embargo contra entidades públicas. Mesmo se tal fosse possível, se o embargo de obra nova ambiental pudesse ser prosseguido contra entidades públicas no caso do pedido ser efectuado por associações de defesa do ambiente, tal meio não podia ser utilizado por qualquer particular em relação à administração, portanto a tutela individual dos privados no âmbito das relações administrativas de ambiente continuaria com graves falhas.
O Professor Vasco Pereira da Silva enumera três soluções passíveis de recondução dos embargos do ambiente à regulação de outros meios processuais pré-existentes:
1. Uma primeira tese, defendida por Freitas do Amaral e Gomes Canotilho, procede à equiparação dos embargos do ambiente ao embargo de obra nova, mas apenas comporta a tutela dos direitos subjectivos em matéria ambiental quando estão em causa relações jurídicas privadas e, assim exclui a protecção destes direitos perante entidades públicas;

2. A segunda tese procura fazer corresponder os embargos do ambiente a um dos seguintes meios processuais do contencioso administrativo:

a) A suspensão da eficácia do acto administrativo, prevista nos arts. 128º e segs. do CPTA, que consiste numa providência cautelar susceptível de ser utilizada no âmbito das relações administrativas de ambiente, sempre que exista um qualquer acto administrativo recorrível. No entanto, a utilização deste meio ao nível das relações de ambiente seria limitada, tendo em conta que muitas das actuações administrativas que lesem o ambiente não decorrem de actos administrativos, mas sim de actuações de carácter técnico;
b) A intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias, prevista nos arts. 109º e segs. do CPTA, é um processo urgente que pode ser requerido quando a célere emissão de uma decisão de mérito que imponha à Administração a adopção de uma conduta positiva ou negativa se revele indispensável para assegurar o exercício, em tempo útil, de um direito, liberdade ou garantia, por não ser possível ou suficiente o decretamento de uma providência cautelar –nº1 do art. 109º. De acordo com o nº2 do referido preceito, a intimação também pode ser dirigida contra particulares, como concessionários;
c) A acção para o reconhecimento de direitos ou interesses legalmente protegidos, referida nas alíneas a) e b) do nº2 do art. 37º do CPTA, é considerada um meio principal na qual inexiste o efeito suspensivo imediato que constitui uma característica dos embargos do ambiente de acordo com a Lei de Bases, sendo assim posta em causa a plenitude da tutela assim conseguida ao excluir o âmbito das relações privadas de ambiente.

3. A última tese é denominada por tese “mista” pois equivale os embargos do ambiente tanto ao embargo de obra nova, como aos mencionados meios do contencioso administrativo. Esta tese consegue assegurar uma tutela mais ampla em matéria ambiental do que as duas anteriores, uma vez que a defesa dos direitos ambientais afectados em relação a privados era prosseguida através do embargo de obra nova, enquanto que em relação a entidades públicas se utilizariam os meios processuais do contencioso administrativo. Esta tese implica a existência de uma dualidade de jurisdições relativa a um único meio processual no que respeita à tutela dos direitos das relações ambientais, e a consequente possibilidade de ocorrência de conflitos de jurisdição. Por outro lado, apesar da conjugação de todos estes meios processuais, os direitos dos particulares continuavam a carecer de uma tutela plena.

Como conclusão, a tentativa de corresponder os embargos em matéria ambiental a outros meios do contencioso não se revelava completamente satisfatória porque não conseguia garantir a tutela de todos os direitos ambientais que necessitavam de ser defendidos. A situação da tutela judicial do direito ao ambiente implicava o surgimento de casos de sobreposição de meios processuais e de jurisdições competentes, susceptível de provocar graves problemas de denegação de justiça. Perante estas consequências, colocou-se a questão da inconstitucionalidade das disposições reguladoras dos embargos do ambiente, por violação dos princípios do acesso à justiça e da tutela jurisdicional plena e efectiva dos cidadãos – arts. 20º e 268º, nos. 4 e 5 da CRP. Deste modo, poderia ser colocada a questão da inconstitucionalidade parcial do art. 42º da Lei de Bases, seja por acção ou por omissão, na medida em que a recondução dos embargos do ambiente a outros meios processuais conduzisse a situações de ausência ou de sobreposição de tutela. Existia inconstitucionalidade por acção nos casos em que o meio processual era considerado inútil ou de difícil e incerta aplicação, pela violação do direito fundamental ao ambiente (art. 66º CRP), que prevê a existência de meios procedimentais e processuais necessários e adequados à tutela do direito em causa, e pela violação do direito fundamental de acesso à Justiça, bem como a uma tutela judicial plena e efectiva dos direitos dos cidadãos – arts. 20º e 268º, nos. 4 e 5 da CRP. Por outro lado, existia inconstitucionalidade por omissão das medidas legislativas necessárias para tornar exigíveis as normas constitucionais (art. 283º da CRP), uma vez que estava em causa a preterição de um comportamento devido, que consubstanciava-se na obrigação de dar realização processual ao direito ao ambiente.


III – Situação actual dos Embargos Administrativos

A reforma do processo civil de 95/96 alterou a situação da tutela judicial do ambiente. A reformulação das normas reguladoras do embargo de obra nova parece manifestar uma intenção do legislador no sentido de considerar que os embargos do ambiente se devem reconduzir aos meios contenciosos pré-existentes, tal como já se defendia através das teses referidas.
A nova formulação dada ao art. 414º do CPC estabelece que “não podem ser embargadas (…) as obras do Estado, das demais pessoas colectivas públicas e das entidades concessionárias de obras ou serviços públicos quando, por o litígio se reportar a uma relação jurídico-administrativa, a defesa dos direitos ou interesses lesados se dever efectivar através dos meios previstos na lei de processo administrativo contencioso”. Deste preceito se retira “a contrario” que o embargo pode ser utilizado também contra entidades públicas, no âmbito de relações administrativas de ambiente, sempre que não exista um meio específico do contencioso administrativo. Deste modo, a reforma do processo civil veio conferir sentido útil aos embargos administrativos previstos na Lei de Bases do Ambiente, fazendo-o corresponder ao embargo de obra nova, assim como a outros meios do contencioso administrativo.
Sintetizando, do novo regime legal dos embargos do ambiente retiram-se os seguintes aspectos:
1. A aplicabilidade do embargo de obra nova em matéria ambiental, sempre que estejam em causa relações jurídico-privadas;

2. A aplicabilidade do embargo de obra nova também às relações administrativas apenas nos casos em que não exista um meio específico do contencioso administrativo. Deste modo, se se estiver perante uma relação administrativa do ambiente, deve-se apurar:
a) Se a lesão do direito ao ambiente foi causada por um acto administrativo recorrível, caso em que existe um meio específico do contencioso administrativo, que consiste na suspensão da eficácia do acto, pelo que é ele o aplicável;
b) Se a lesão do direito subjectivo ambiental foi provocada por um privado no âmbito de uma relação administrativa multilateral, neste caso existe um meio específico do contencioso administrativo para paralisar essa actividade, que é a intimação para protecção de direitos, liberdades e garantias;
c) Nos restantes casos de relações administrativas ambientais, e na ausência de outras providências cautelares específicas do contencioso administrativo, pode ser utilizado o embargo de obra nova (v.g. num caso onde se verifica uma lesão no ambiente causada por uma actuação administrativa de carácter técnico).

As vantagens do novo regime legal são as seguintes:
• A clara vontade do legislador no sentido de proceder à equiparação da previsão legal do embargo do ambiente ao embargo de obra nova, como meio eficaz de tutela dos direitos subjectivos nas relações jurídicas ambientais, ainda que sem abdicar da utilização dos meios processuais do contencioso administrativo;
• A extensão do âmbito do embargo de obra nova também às relações administrativas de ambiente, sempre que não exista outro meio processual específico do contencioso administrativo. Deste modo são solucionados os problemas levantados pela fraca tutela dos direitos subjectivos públicos em matéria ambiental através da preferência por um meio processual mais eficaz;
• Delimitação mais clara dos diferentes meios processuais, no que diz respeito à utilização de meios do processo civil e do processo administrativo.

Os seguintes aspectos consubstanciam-se nos principais inconvenientes:
• Manutenção da dualidade de jurisdições em matéria de contencioso do ambiente, com a agravante do facto da delimitação de jurisdições já não estar relacionada com a natureza da relação jurídica em causa;
• Probabilidade de existirem conflitos positivos e negativos de jurisdição, uma vez que os direitos das relações administrativas em matéria ambiental tanto podem ser da competência dos tribunais comuns como dos tribunais administrativos. Esta situação pode equacionar uma incompatibilidade entre este regime legal e a opção constitucional de atribuir aos tribunais administrativos a competência para “o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas” – art. 212º, nº3 CRP.


IV - Conclusão

O legislador devia ter tomado uma opção diferente da que se espelha no actual regime jurídico dos embargos administrativos. Uma opção correcta consiste na criação de um meio específico de tutela provisória ou cautelar dos direitos subjectivos ambientais, susceptível de ser aplicado a todo o universo das relações jurídicas ambientais (públicas ou privadas), e da competência de uma única jurisdição - cuja solução mais adequada era ser a comum, mas que também poderia ser a administrativa. Por outro lado, também devia ser criada uma acção específica para os direitos subjectivos do ambiente (públicos e privados), adequada à especial natureza dos interesses em conflito e das necessidades de tutela neste âmbito. Deste modo, o contencioso ambiental passaria a abranger não só um específico meio de tutela cautelar, mas também um específico meio de tutela definitiva, os quais seriam atribuídos a uma única jurisdição.
Por fim, cumpre apurar se o novo regime legal dos embargos administrativos criado pela reforma do processo civil respeita a Constituição. O problema que se pode continuar a suscitar acerca da eventual inconstitucionalidade deste regime legal já não está relacionado com a questão da plenitude da tutela do direito ao ambiente, mas sim com a efectividade dessa tutela. A efectividade dos embargos do ambiente pode ser posta em causa devido à possibilidade de verificação de frequentes conflitos de jurisdição, e à existência de problemas de harmonização do embargo de obra nova com o universo do ambiente, tendo em conta que se trata de um meio originariamente concebido para a tutela de direitos reais e não de direitos que, em regra, apresentam uma natureza obrigacional, e, por outro lado, o pedido de suspensão de uma construção é diferente do pedido de cessação duma actividade poluente.


V – Bibliografia

Silva, Vasco Pereira; Da Protecção Jurídica ambiental – os denominados embargos administrativos em matéria de ambiente; AAFDL, Lisboa, 1997;
Silva, Vasco Pereira; Verde Cor de Direito – Lições de Direito do Ambiente; Almedina, 2002

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